domingo, 12 de agosto de 2012

Encontros: O conselho de Nélida Piñon

Talvez uma das maiores emoções da minha vida: ter conhecido Nélida Piñon. A imortal, a primeira mulher presidente da Academia Brasileira de Letras, a conhecida mundialmente. A Nélida.

O encontro foi na Bienal do Livro, no espaço mulher em foco, onde Nélida falava sobre sua obra, e sua trajetória tão rica e interessante. Como o tempo era curto, só pude lhe fazer uma pergunta. A pergunta que move a existência desse blog. O que é o ofício de escritor, e qual o conselho que você daria para um jovem escritor como eu?


“Prepare-se para o ofício. Este não é um ofício que cai do céu, de presente. Eu acho que é uma sorte, é um dom maravilhoso mas que exige trabalho, devoção, leitura, cultura, tudo isso é fundamental, muitas vezes você tem dentro de você um material precioso, aí você joga no primeiro livro e pronto, o poço fica vazio. É preciso reabastecer constantemente este poço com observação, com capacidade de quebrar tabus, com a capacidade de dominar a língua, dominar esse instrumento tão poderoso que é a língua portuguesa sem medo, sem temor. Não ter medo, acho muito importante não ter medo. Não esperar glória ou reconhecimento, nem pensar que a literatura é constituída de anjos, porque há gente com muito talento, que nem sempre são generosos. A criação é maravilhosa com suas particularidades e singularidades, mas a carreira pode ser terrível porque você nem sempre encontrará pessoas generosas que irão te ajudar ou fazer com que você siga adiante. O ofício de escritor é uma mistura de sensibilidade aguda e coragem. E não desista, não importa o que digam de você e da sua obra.”




Podem até não haver muitas pessoas generosas no caminho, Nélida, ainda bem que você é.

Hudson Pereira

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Exposição: 100 anos de Nelson Rodrigues no Centro do Rio


2012 é ano que marca o centenário do nascimento do grande Nelson Rodrigues e quem mora no Rio de Janeiro, e gosta de boa literatura, tem o dever cívico de visitar a exposição “Nelson Brasil Rodrigues – 100 anos do anjo pornográfico”, e conhecer uma pouco mais do famoso cronista carioca, apelidado de “anjo pornográfico” devido ao conteúdo “imoral” dos seus textos.

Focada principalmente na sua atuação como dramaturgo, a mostra exibe desde resenhas sobre seus trabalhos até objetos pessoais, que incluem roupas e documentos. Uma atenção especial à máquina de escrever que o autor usava para escrever as famosas crônicas da sua coluna "A vida como ela é". Para quem trabalha no centro, vale reservar 10 minutos do seu horário de almoço, afinal, Nelson criou um estilo próprio de retratar a sociedade e é, até hoje, um dos autores mais polêmicos que se tem notícia.

O teatro Glauce Rocha fica na Av. Rio Branco, 179 - Centro, Rio de Janeiro

Hudson Pereira









(A máquina de escrever onde o autor criou suas famosas crônicas)

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Encontros: Com a palavra, Affonso

Hoje, dia 25 de julho, é o dia do escritor. E também é o dia de retomada do blog. E certamente um poeta, ensaísta, crítico e ser humano que pode representar perfeitamente o que é ser um verdadeiro escritor é Affonso Romano de Sant’anna.

Tive o privilégio de ser seu aluno num curso chamado “Leitura Crítica de Poesia” em maio de 2011 em que discutíamos nossos próprios textos e alguns sugeridos por Affonso.

Ler poesia, escrever poesia, perceber a poesia surgindo no dia-a-dia, criação literária e ferramentas da linguagem foram alguns dos temas nas aulas. Revendo minhas anotações, selecionei frases interessantíssimas, um grande aprendizado para quem ama poesia. Sem mais, com a palavra Affonso:

“A poesia se dá da percepção do mundo. Você se alimenta do mundo, o ‘digere’, o transforma, a poesia se faz desse processo.”

“Se a vida não vira texto, ela não existe”

“A tarefa do poeta é articular as palavras, é fundamental olhar o mundo, mas poesia se faz é com palavras.”

“saber > ver > descrever > decifrar”

“Caos + cosmos = caosmos (a obra de arte)”

“O poeta enxerga através das palavras. Sua obrigação é fazer com que todos enxerguem também.”

“O ato de criação é um ato de carência.”

“O lugar-comum é uma armadilha do diabo porque acreditamos que estamos dizendo aquilo, mas não estamos. O escritor de verdade não se deixa dominar pelo lugar comum.” (falando sobre lugares-comuns, os clichês)

“Tradição: ou você renova ou faz paródia.”

“Cometer falhas, só conscientemente.”

“Ao contrário do que dizem, não há formas esgotadas. Há pessoas esgotadas diante de certas formas.” (falando sobre sonetos)

“O artista é um indivíduo que sabe ver (desvendar) o que os outros não estão vendo por isso que a arte existe e é necessária.”

Hudson Pereira





(fotos da turma: acervo pessoal)

domingo, 3 de julho de 2011

Escrever: a maldição de todo escritor.

Bem, obviamente, para uma pessoa ser considerada escritora, basta que ela faça uma única coisa: escrever. Sem julgamento de talento ou qualificação, todo aquele que tem tais pretensões precisa exercitar ao máximo a sua escrita até atingir o que considerar qualitativo. Mas e quando escrever se torna uma maldição, como faz?

Certa vez, uma colega com quem eu fiz um curso sobre poesia contemporânea disse o seguinte:

- Às vezes é uma coisa horrível, insuportável. Vem enquanto estou na fila do banco, do supermercado, ou pronta pra dormir!

Ela se referia ao fato de um poema surgir pronto nas horas mais improváveis e ela precisar anotar desesperadamente antes que o perdesse. É bem por aí. A mente é uma máquina que não descansa.

Eu, que passo uma boa parte do meu tempo escrevendo, vou falar um pouco da minha experiência. Comecei a escrever poesia há 6 anos, e por muito tempo me dediquei só a ela. Em 2007 criei meu primeiro blog, somente de poemas e prosas poéticas e este já conta 300 postagens. Terminei recentemente o meu primeiro livro que comecei a escrever em 2008 e que, dificilmente achei que terminaria. Em 2009, estudei Literatura Infanto-juvenil e criei um blog de poesias infantis. Para relaxar um pouco dos versos, criei este blog em março de 2010 para falar dos meus interesses em literatura e sobre os eventos que participo. No fim de 2010 reuni algumas cartas de amor fictícias que tinha escrito como parte de um projeto e criei um blog só para estes textos. E para relaxar da poesia, das cartas, das resenhas e dos blogs, criei um blog sobre moda e comportamento em 2011. Então, de repente me vi escrevendo para 5 blogs. Cinco, Five, V blogs diferentes.

E não parou por aí. Estou escrevendo paralelamente o roteiro de um curta-metragem e uma peça de teatro, além das minhas atividades como professor de inglês e das obrigações da vida. Cada vez que tento esvaziar a cabeça de idéias, novas surgem. A poesia é a experiência metafísica, os blogs são mecanismo de expressar opinião e a dramaturgia, a fundição de experiências de vida a dos meandros da imaginação, e me pergunta se eu estou cansado? Não estou não.

Especificamente quando se trata do fazer poético, a situação é mais grave. Um texto de blog pode ser trabalhado várias vezes, ser pesquisado, a idéia vem e você pode trabalhá-la depois. Mas o poema não, o poema te invade sem pedir licença e se você não capturá-lo, ele nunca mais volta. Poetas são reféns da sua inspiração.

Escrever é uma maldição. Ela nos aprisiona a algo do qual não queremos nos libertar, tanto é que estou aqui, na frente deste computador às 00:27 de um sábado escrevendo esta crônica.

Hudson Pereira





segunda-feira, 20 de junho de 2011

Dica de Filme: “Meia noite em Paris” do Woody Allen.

Sinopse:


Gil (Owen Wilson) sempre idolatrou os grandes escritores americanos e quis ser como eles. A vida lhe levou a trabalhar como roteirista em Hollywood, o que se por um lado fez com que fosse muito bem remunerado, por outro lhe rendeu uma boa dose de frustração. Agora ele está prestes a ir para Paris ao lado de sua noiva, Inez (Rachel McAdams), e dos pais dela, John (Kurt Fuller) e Helen (Mimi Kennedy). John irá à cidade para fechar um grande negócio e não se preocupa nem um pouco em esconder sua desaprovação pelo futuro genro. Estar em Paris faz com que Gil volte a se questionar sobre os rumos de sua vida, desencadeando o velho sonho de se tornar um escritor reconhecido. (fonte:Adoro Cinema)

Todas as críticas e sinopses divulgadas fazem a gente crer que o novo filme do (genial) diretor americano Woody Allen trata-se de uma comédia romântica, simples assim.

A comédia (sempre inteligente) está lá. O romantismo idem. Mas acima de tudo “Meia Noite em Paris” é um filme obrigatório para amantes de artes e literatura, principalmente os que têm pretensões artísticas. Ao explorar a idéia de que “bons tempos não voltam mais” Allen escreveu a história de um homem que acredita estar fora de seu tempo e o dá a oportunidade de viajar ao passado, à Paris dos anos 20 onde ele conhece seus ídolos: F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, T.S Eliott, Gertrud Stein, além de Picasso e tantos outros artistas. Então, toda noite quando o relógio anuncia 12 horas, Gil embarca na viagem buscando aprimorar-se como escritor. Só que ele percebe através da personagem Adriana, vivida por Marion Cottilard, que assim como ele, sendo dos anos 2010, acha que a vida era melhor no ínicio do séc XX, as pessoas dos anos 20 também tem a impressão que o passado era mais interessante.

Então, eis a mensagem que capturei do filme: é preciso viver a arte e a literatura da nossa época e tentar transmitir os nossos dramas e alegrias, porque no futuro, também seremos uma espécie de Bélle Époque.

Saí do cinema com uma questão: Se você pudesse fazer uma viagem no tempo e conhecer seus ídolos, quem vocês conheceriam?

Fotos: Divulgação

Texto: Hudson Pereira

(O diretor Woody Allen e os atores)
(Pôster Internacional)
(Pôster Nacional)

TRAILER LEGENDADO:

terça-feira, 12 de abril de 2011

Dica de Livro: O Quieto Animal da Esquina de João Gilberto Noll

Quando Caio Fernando Abreu comparou a escrita de Noll com o ato de vomitar ele usou de toda sua ironia. Não sabia ele, porém, que tal alegação se tornaria a melhor definição para este “Quieto animal da esquina”, livro de João Gilberto Noll lançado pela primeira vez em 1991 e relançado em 2003 pela editora Francis. Noll nos apresenta um narrador-personagem homem comum, desempregado, morador de periferia que conta sua história através do fluxo de consciência, os fatos são expostos simultaneamente, todos de uma só vez. Por isso é como vômito, o leitor precisa mergulhar no texto, tatear a massa consistente da narrativa e assimilá-la, não buscando linearidade ou lógica. Noll põe em cena um protagonista vazio que conta sua história de forma incompleta, deixando lacunas que o leitor deve preencher. A narrativa é toda em primeira pessoa. O livro começa com o protagonista dando uma visão geral de sua vida. Ele, poeta que pouco escreve, desempregado, drogado, desacreditado, um entre tantos moradores das periferias do país. De repente é preso sem sabermos o motivo. É levado para a casa de um homem, sem sabermos quem é este homem e qual o motivo que o faz abrigar o protagonista. Durante toda história nos deparemos com fatos mal explicados, diálogos subjetivos e ações irregulares.
Este livro é um excelente expoente da literatura contemporânea: cheio de referências da pós-modernidade. A identidade indefinida do protagonista exemplifica a perda de identidade dos indivíduos. A ação focalizada no presente, nenhuma utopia ou crença no futuro são outros itens explorados na história. O erotismo é nu e cru, ligado somente ao físico. As cenas de sexo são descritas rispidamente; não há envolvimento afetivo nem busca de companhia, ao contrário, as relações sexuais apenas confirmam a solidão dos personagens e sua plena aceitação disso. Não temos noção de tempo. Não sabemos datas ou a duração dos acontecimentos. Os parágrafos têm tamanhos irregulares, uns muito grandes outros pequenos, justamente para representar esta ação descontínua. Esse vazio de informações reflete o vazio existencial do personagem; entre ele e a sociedade há um vazio tão grande que, ao invés de tentar transpô-lo, ele o aceita e se entrega, naufraga na bruma deste vazio. Noll intriga os leitores com a falta de linearidade, em vários momentos são jogados fatos que dizem respeito à outros momentos da trama e é preciso atenção para fazer as conexões. Muitos destes fatos são pistas que o autor dá para compreendermos o que aconteceu com o protagonista, e seguindo tais pistas constatamos que ele não é um narrador confiável pois não narra sua trajetória de maneira comprometida com a verdade, é apenas a sua versão. A tensão da narrativa e suas lacunas prendem o leitor de tal forma, que Noll consegue instigar todos nós a descobrir o que não foi revelado, a nos questionar se fomos realmente capazes de entender o texto entre suspeitas e dúvidas. A história de um homem nunca foi tão desafiadora. E se lembrarmos da declaração de Caio Fernando Abreu, afirmo sem titubear que sim, este livro é um vômito, o herói nada heróico expele sua própria história e o leitor não deve agir com repugnância ou receio de mergulhar no líquido disforme da narrativa. Um texto que incomoda, nauseia e desafia. . Fotos: Google Texto: Hudson Pereira

quarta-feira, 30 de março de 2011

Sylvia Plath Forever!

Sylvia Plath foi uma americana rica, bonita, loira e tinha olhos verdes. Sylvia Plath foi uma americana inteligente, culta, talentosa e tinha uma carreira promissora como escritora e professora universitária. Sylvia Plath foi uma mulher que amou demais, e isso parece ter engolido todos os adjetivos anteriormente citados. No início dos anos 50, Sylvia estudava na Universidade de Cambridge, onde era bolsista integral devido à suas incríveis qualificações. Foi lá que conheceu o poeta Ted Hughes, com quem veio a se casar em 1955, 4 meses após conhecê-lo. Contudo, a vida com Hughes não seria nada fácil e transformaria a promissora carreira de Sylvia em coadjuvante à do marido.


( Sylvia e o marido, o poeta Ted Hughes)


“Vi minha vida se desenrolar diante de mim como uma figueira de um conto que havia lido. Da ponta de cada ramo, um gordo figo roxo acenava e me seduzia com um futuro maravilhoso. Um figo significava um marido e um lar feliz com filhos, outro era uma poetisa famosa, outro uma professora, outro era Esther Greenwood, a surpreendente editora, outro era a Europa, a África e a América do Sul, outro Constantin e Sócrates e Átila, um bando de amantes com nomes esquisitos e profissões originais, outro ainda era uma campeã olímpica, e acima de todos esses figos havia muitos outros que eu não conseguia entender. Vi-me sentada sob essa figueira, morrendo de fome, só porque não conseguia decidir qual figo escolheria. Queria-os todos, e escolher um significava perder o resto. Incapaz de me decidir, os figos começavam a murchar e apodrecer, e um a um caiam no chão a meus pés.” Esse é um trecho de “The Bell Jar” (A redoma de vidro) seu romance autobiográfico, onde Sylvia contesta as escolhas durante a vida, e o impacto que a morte de seu pai, quando ela tinha 8 anos trouxe para sua poesia.



Durante o casamento com Hughes, Sylvia teve de conviver com as inúmeras traições do marido, com alunas (ambos eram professores de literatura), fãs e até amigas de Sylvia, como foi o caso de Assia Wevill, a quem Hughes engravidou, e por quem abandonou Sylvia em 1962. Nos meses seguintes, Sylvia mergulhou numa depressão profunda que culminou na manhã fria do dia 11 de fevereiro de 1963 quando Sylvia suicidou-se inalando gás de cozinha. Deixando um livro pronto sobre a escrivaninha e seus dois filhos trancados no quarto. Este livro: “Ariel” tornou-se um best-seller instantâneo quando publicado, tornando sua autora a poeta de língua inglesa mais vendida e ganhando inúmeros prêmios póstumos. Uma frase do poema “Lady Lazarus” tornou-se referência quando se fala de Sylvia Plath:



“Dying Is an art, like everything else. I do it exceptionally well.”


Traduzindo:


“Morrer É uma arte como todo o resto. Eu o faço excepcionalmente bem.”

Nos anos seguintes Ted passou a ser considerado um poeta maldito. Era comum ele ser interrompido em suas palestras e apresentações sob vaias e ofensas como “assassino!”, também era comum o sobrenome de Ted ser arrancado da lápide de Sylvia. Ted morreu de câncer em 1998, deixando livros publicados sempre sob a sombra do passado. Sylvia morreu em 1963 deixou um legado maior que a vida.

Texto:Hudson Pereira
Fotos:Google